O procurador da República Tiago Rabelo, que atua em Marabá, avalia que os altos índices de violência no campo em especial na região sul do Pará se justificam pela falta de policiais e servidores responsáveis por investigar os crimes. "A Polícia Civil, hoje em dia, não tem pernas para apurar", comenta. "Nessa região, notadamente, os governantes compadecem com uma polícia pessimamente estruturada".
Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), 1.581 pessoas foram assassinadas no campo nos últimos 25 anos. E a maior parte dos crimes ocorre no Pará. Só em 2010, foram 18 casos no Estado dos 34 registrados em todo o País.
Na última semana, no Pará, foi assassinado o casal de líderes extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo. No sábado (28) assentado Herivelto Pereira dos Santos também foi morto na mesma região. A CPT afirma que o Ministério Público tinha sido informado de que José Cláudio e Maria eram ameaçados, o que Rabelo nega. Ele rebate a dificuldade de ação dos procuradores também com a falta de pessoal.
- A CPT tem razão em evidenciar a propalada impunidade, que de fato existe, mas o Ministério Público Federal não pode invadir a atribuição de outros órgãos, é bom que fique claro - justifica.
Em seguida, aponta que até mesmo os órgãos federais não dão conta das demandas. Rabelo, que é membro da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo e atua em Marabá há mais de dois anos, avalia que muitos servidores se negam a trabalhar na região.
- No Sul e Sudeste do Pará são 38 municípios para apenas dois procuradores da República e nove delegados da Polícia Federal... Ouve-se muito que a Amazônia Legal é prioridade, mas se fosse prioridade mesmo não seria assim. A realidade aqui é de extrema carência de pessoal e de equipamento.
Leia a entrevista.
Terra Magazine - O Pará é o Estado que mais registra assassinatos no campo. Em 2010, segundo a CPT, foram 15. O que explica esse número chocante?
Tiago Rabelo - Nesse ponto, a CPT tem razão em evidenciar a propalada impunidade, que de fato existe, mas o MPF não pode invadir a atribuição de outros órgãos, é bom que fique claro. Mas a impunidade existe. A responsabilidade é muito mais política. A Polícia Civil, hoje em dia, não tem pernas para apurar, eficazmente, esse tipo de crime em que a elucidação da autoria é muito complexa. É preciso dotar as polícias civis do aparato adequado. Na situação que está atualmente é mesmo muito difícil desenvolver uma investigação profícua e célere. É uma questão estrutural e política acima de tudo.
Questão política? O senhor avalia que autoridades locais interfiram pra atrapalhar a investigação?
Falar é fácil, provar é difícil. No âmbito federal, eu não tenho notícias desse tipo de interferência indevida. O que ocorre é uma interferência indireta, porque não se instrumentaliza e não se equipa as polícias da maneira correta. E isso decorre de uma omissão histórica da política. Dos governantes. Nessa região, notadamente, os governantes compadecem com uma polícia pessimamente estruturada.
Quando o senhor fala em equipar a polícia, se refere a que? O que falta?
Principalmente gente. É preciso rever os critérios de lotação de servidores nas polícias e em todos os órgãos públicos aqui na região. Muitas nomeações são subjetivas. Geralmente não se leva em conta a extensão territorial e a dificuldade de acesso aos assentamentos. Só aqui na região de Marabá a gente conta com 503 cujo acesso é extremamente difícil. Em períodos de inverno, praticamente impossível. As pessoas chegam aqui e almejam remoções, saem em alguns meses e muitas vezes não são substituídas. Ouve-se muito que a Amazônia Legal é prioridade, mas se fosse prioridade mesmo não seria assim. A realidade aqui é de extrema carência de pessoal e de equipamento.
Carência nas polícias e no Ministério Público também, é de se imaginar.
Não posso dizer que seja diferente. Aqui somos apenas dois que respondemos por todo o Sul e Sudeste do Pará. São 38 municípios para apenas dois procuradores da República e nove delegados da Polícia Federal. É pouco, até mesmo pela demanda muito grande. Reforma agrária, conflitos agrários, meio ambiente, trabalho escravo, direito à memória e à verdade... infinitas demandas.
Fonte: Terra Magazine / Dayanne Sousa
Disponível e acessado em: http://www.gta.org.br/noticias
Nenhum comentário:
Postar um comentário